Entrevista: Du Delai (Bluestones e Big Lips/Palotina)
(Foto: Facebook Eduardo Delai)
Conheço o Du Delai desde a época da "gangue" do prézinho da Escola Joaquim, quando meu irmão estudava junto com ele. Pelo que me lembro, Du era figura recorrente no castigo fora da sala de aula, junto com o Bonfim, o Gustavo Ortolan, o Eduardo Falconi - dentre outros. Desde aquela época de gurizinho, o Du já demonstrava que tinha a alma livre, alma rock'n'roll. A partir daí, o pouco do que eu sei sobre história do rock palotinense envolve momentos em que o Du esteve presente na maioria das vezes.
Ler os depoimentos do Du me deixou emocionada e espero que vocês possam sentir um pouco dessa emoção ao embarcar comigo na entrevista que ele fodasticamente me concedeu, com citação de Machado de Assis e tudo mais... Fiz questão de editar o mínimo possível da fala do Du, por isso mantive as respostas mais longas. Tem muito ouro nessas lembranças e eu não estava disposta a perder.
Com vocês, Du Delai:
Rock do Velho Oeste: Du, queria queria saber das tuas memórias mais antigas de rock and roll em Palotina... Das bandas que você lembra que tocavam rock... Das bandas nas quais participou...
Eduardo Delai: Vamos lá... Minhas memórias... Ao verme que primeiro roeu as carnes frias de meu cadáver dedico estas memórias póstumas. Bom, como muito dos meus conterrâneos e contemporâneos, eu cresci em uma família avessa ao rock e suas vertentes. Eram comuns estereotipizações do tipo: "rockeiro é tudo um bando de drogado, maconheiro sem vergonha, cabeludo bêbado, satanista vagabundo" etc. (favor ler isso com sotaque italiano). Ironicamente, também era uma família muito musical. Meus pais cantavam (e ainda cantam) em coral, ouviam muita música nativista, sertaneja, italiana. Comecei a estudar música aos 11 anos. O teclado foi o instrumento escolhido.
Nesse meio tempo vem a primeira lembrança de uma banda de rock palotinense que me influenciou. O Fernando Bonfim tinha uma banda que tocava no colégio, normalmente no recreio ou em feriados. Lembro que também tinha o Leonardo Pozzer e o Rudi (Blauth). Mais tarde esses caras seriam a espinha dorsal da Banda Miragem, que tocou por muito tempo aqui na região. No colégio, o Santo Agostinho, eles tocavam rock. Lembro algo de Titãs e Mamonas. Eles tocaram "Brasília Amarela" em um recreio. Foi uma festa. Pouco tempo depois se uniu a eles o Zé. Conheci o Zé certa vez numa partida de salão. Não demorou para que combinássemos uma jam com guitarra e teclado. Nessa época eu já ouvia bastante rock. Tinha minhas fitas cassete com músicas gravadas do rádio. às vezes ligava lá pra pedir música. Era bem mais difícil o acesso naquela época, então era o que rolava entre os jovens da época: Nirvana, Guns, de nacional Legião, Engenheiros, Raul...
Nesse tempo eu já me perguntava como podia todos meus amigos rockeiros serem legais e não terem nada a ver com aquilo que se falava de mal sobre a figura do "rockeiro", enquanto todo mundo sabia de empresário cheirador de pó, gente alinhada que espancava mulher e filhos, ultra religiosos que viviam bêbados em bordéis. Era muita hipocrisia para engolir. Então me juntei de vez ao lado negro da força rsrsrs. Já tinha gasto meus primeiros salários aos 14 anos com os caríssimos cds na época, o Black album do Metallica e um duplo ao vivo do Maiden quando o Zé veio com aquela lendária Eagle e uma Zoom 1010. Foi a primeira vez que ouvi o som de uma guitarra moendo com distorção. Era incrível..
Algumas jams depois ele me chamou para a Projeto 4, primeira banda em que eu toquei. A banda estava se reorganizando após a saída do Bonfim para a banda Miragem e do Felipe Zago, hoje nosso secretário de administração municipal. Daí tinha os irmãos Matheus e Marcelo Zago na cozinha, o Zé na guitarra, eu no teclado e o Dângelo no vocal. O Dângelo vive hoje numa comunidade alternativa e o nome dele lá é Yosher Kol'lev. Mó barato! O novo Projeto 4, agora com 5 integrantes, fez um único show e terminou. Super normal, inclusive pros padrões atuais, rsrsrs. No ano seguinte, eu entrei na Thyfoiders (lê-se tifóiders). Tenho a camisa dessa banda até hoje, surradíssima. Thyfoiders era eu, Taiomara , Delfe, Diego Boff e Gustavo Ortolan. Depois, passaram por ela também o Zé (devolvi o favor e chamei ele pra banda, hehe) e o Emanuel. (Fernandes). Chegamos a tocar em Umuarama, num show que foi um fracasso total, num bar chamado Araucana. O interessante é que sentado ali estava meu pai, tão avesso ao rock, apoiando totalmente a gente.
Nesse tempo e dali pra frente surgiam várias bandas em Palotina. Eu lembro da Rataplan, que tinha o (Gustavo) Ortolan e o Diego Boff da antiga Thyfoiders mais o Tragueta e o Maicon. Tinha a galera da Rosa Púrpura, que tinha um baita vocal e fazia um som mais autoral. A South Park com o Bugiga, Mau mau, Du Romani e Comodo fazia um punk rock e tinham algumas autorais. Lembro que chegaram a gravar um CD próprio, que foi produzido na garagem da casa do Fernando Bonfim. Teve uma banda que eu não consigo lembrar o nome, talvez o Bonfa me ajude nessa, que era a banda do "padeiro". Tinha o Thiago Giacomini no baixo, que foi pra banda Miragem depois e o "padeiro", que era um ruivão (Ernani, mais conhecido como Mikuim) que trabalhava na padaria, mandava o fino do vocal! Todos mandavam muito bem. Teve uma Expo-Palotina que eles tocaram "Ilari Ilari Ê" da Xuxa no palco principal. Era um povo divertido. A Anomaly 777 era uma galera dark das trevas que fazia new metal autoral com vocal scream. Ali tinha o Maykel, o Jony e o Serginho. Depois, foi base pra várias outras bandas que vieram mudando um e outro integrante.
A mesma coisa aconteceu com a gente. Mudava apenas um e outro integrante, a banda já mudava de nome. Fora eu, Zé e Manú (Emanuel Fernandes), o Dilção Diuzoooito (Edilson Ferreira) veio depois. As bandas foram: Ragnarock, Insanos e Profanos, Eqüichtenha, Dextroy, Cogumelo Atômico e, por último, Máquinas Velhas. Cara, teve até uma vez que a gente tocou no Ceeduc com o nome "Fiapos de Manga", dá pra acreditar!?
Dessas todas, a que durou mais tempo foi a Máquinas Velhas, com o Beto na batera. Algumas garotas também fizeram parte da banda, atuando no vocal, mas não de forma simultânea: Aline (Sproesser Mass), Dea (Andreia Sproesser Mass) e Jujú (Juliana Freitag).
RDVO: Caramba, Du... Tô emocionada, sério. E sobre os seus projetos atuais?
ED: A Big Lips é uma banda que foi formada no ano passado (2016) com o intuito de que cada integrante pudesse escolher músicas que sempre teve vontade de apresentar no palco. Até o momento o repertório é mesclado entre rock progressivo, rock clássico e uma pitada de metal old school. A banda conta com o Jairo Klein nas baquetas, Sinuê Giacomini na guita, Vitor Vassoler no baixo e eu no teclado e vocal.
Integro também a Bluestones. Essa é calcada no rock clássico anos 60 e 70. A banda surgiu ano passado com os irmãos Ricardo e Eduardo Motter na batera e guitarra com o Vini Pelin no baixo e o Matheus Gentil na voz e guita base. Mais tarde me juntei a eles com teclado e backing vocal, lead vocal em algumas músicas. Com a saída do Vini e do Matheus, eu assumi o baixo por um curto período e, como nas minhas bandas pós-Thyfoiders, assumi o vocal principal. Ano passado, no Lollapalota, entretanto, fui apenas de vocal principal enquanto o Vini fazia sua despedida na baixaria da banda. Este ano convidei o Maykel para assumir o baixo e backing vocal. Eu vou continuar no vocal e fazer guitarra base em algumas músicas, talvez teclado em outras. A banda está se reestruturando.
Outras participações minhas envolvendo música incluem o coral municipal e o grupo de canto Terra Nostra, onde faço alguns arranjos e passo as quatro naipes da polifonia vocal. Estas duas atividades estão abertas ao público que quiser participar e são apoiadas pelo município.
Também leciono teclado, piano popular e técnica vocal pela Sonora. Quando recebi o convite fiquei entusiasmado por se tratar de uma instituição de muito prestígio na região, casa de músicos formidáveis. Quem quiser ter aulas comigo pode contatar o pessoal da Sonora. Tenho tido a chance de incluir música como apoio à atividades de incentivo à leitura em sala de aula. Nas escolas municipais, é incrível ver o quanto a música prende a atenção das crianças e desperta a curiosidade. Eu acredito que tem princípios que devem ser trabalhados desde cedo, e, sem dúvida, a música é enriquecedora e auxilia no desenvolvimento físico e mental, entre tantas outros benefícios que ela traz.
RDVO: Du, eu sempre falei pro Jairo e pro Bonfim que você não estar em uma banda era um total desperdício como multi-instrumentista! Quando ele me falou que você ia assumir o vocal da Big Lips, eu bem que pirei! Dos vocalistas das bandas de rock de Palotina, eu realmente acho que você é um dos três que consegue notas pra cantar Dio e Bruce Dickinson!
ED: Caramba, obrigado! Lisonjeado aqui!.
RDVO: Como foi o convite pra participar do tributo ao Raul com o Manu? Você estava no tributo ao Legião em 2006 com o Manu também?
ED: Sim, eu fazia parte em 2006 da banda que organizou o tributo à Legião, por ocasião dos 10 anos de morte do Renato Russo. Ali era basicamente a Máquinas Velhas com um outro baterista, o Charles Miotti. Contamos com algumas participações especiais de peso também em algumas músicas, como o Aquiles da Cruz no violino e a Juciara Ribeiro interpretando uma canção. A entrada foi toda em alimento não perecível que foi depois repassado para entidades que trabalham com pessoas carentes.
RDVO: Depois teve a participação no tributo ao Raul, né?
ED: Sim, já no tributo a Legião a gente ficava namorando a ideia de fazer mais um, dessa vez pro Raul. Na empolgação a gente falava em fazer no próximo ano, 2007, depois no próximo, etc.,
assim foi por 8 anos. Em 2013 enfim se realizou. Eu morava em Curitiba e soube de antemão que o Emanuel tinha a ideia de fazer acontecer. Ele me convidou, eu não perderia a chance de participar disso nem que estivesse do outro lado do mundo! Peguei o busão, vim e tive o privilégio de participar desse evento tão sonhado. Foi um sucesso total, o teatro encheu de gente, mas o mais legal foi a energia do povo. Lembro do pessoal abraçado embaixo do palco cantando junto, dava pra sentir a vibração que era tarnsmitida ali. Tanto que não me aguentei e pulei do palco pra me juntar a eles, passando o microfone para que cada um cantasse um pouco. Foi lindo! O tributo de forma geral foi lindo. A banda estava ótima, com músicos de primeira. Era o Jairo (Klein) na batera, o Bonfa na guita, Vini (Pelin) no baixo, Rafa Pelin no teclado e o Manú no vocal. De músicos convidados, eu e o Zanin. Foi um privilégio enorme.
(Foto: Facebook Eduardo Delai. Tributo ao Raul Seixas)
RDVO: Cara, eu lembro da galera embaixo do palco e de você pulando. Foi emocionante! Sobre a cena rock palotinense, como você avalia ela atualmente?
ED: Eu fiquei feliz em ver que houve renovação no pessoal que anda fazendo um som independente aqui pela cidade. Gente nova surgindo, novas ideias, gente velha segurando as pontas, isso tudo é muito importante. Vejo com importância o papel que desemprenha o pessoal da Rock D'agosto, por exemplo. Na verdade, antiga Rock D'agosto, atual Billy'n'Silva. Porque o Rock D'agosto tinha muito mais cara de ser um movimento do que uma banda, simplesmente. Aquele pessoal - Zanin, Pinduca, Jairo, Mr Leg (Arnaldo, a.k.a Perna), Sinuê - são agitadores culturais, principalmente o Zanin. Já há alguns anos, quando rolavam os ensaios abertos no pesque-pague Pelin, acabava sendo uma grande reunião de entusiastas da música. Os integrantes no fim acabavam fazendo jams com gente de outras bandas, mesclando tudo, criando assim uma espécie de cenário próprio. Eu acho muito importante que as bandas independentes se unam para formar um cenário musical forte. Não existe como isso acontecer em um lugar onde todo mundo quer puxar o tapete alheio. A única maneira é todo mundo se ajudando, prestigiando shows, divulgando, indicando as bandas, tentar realmente vender a nossa cena, seja em material - cds, musica em formato digital, Youtube, etc - seja indicando as bandas locais para shows aqui ou fora. Este blog mesmo é uma excelente iniciativa e que vem a somar muito nesse contexto.
Das bandas que apareceram nos tempos mais recentes vou falar das que eu lembro, espero não cometer alguma injustiça e deixar alguém de fora. Como já citei, Rock D'Agosto que na época tinha o Leandro (Hendges) junto e posterior a isso a atual Billy 'n Silva. O pessoal da Holligans que chegou a lançar videoclipe de música autoral, de duas músicas se não me engano, e era uma piazada cheia de energia que tocava direto aqui e fora da cidade. Tem ainda hoje a Disaster, que faz um post rock cheio de peso e tem seus sons autorais disponíveis em cd ou na internet mesmo. Dalí dois dos integrantes, o João (Vitor) o Luan Vilella e o Rodrigo, bebiam na fonte da After Lightning, que era outra banda responsa que tocava metal.
Do pessoal que continua na ativa, tem ainda a Baú do Manoel Preto, que tocou na Expo 2016. Era demais ver uma fila enorme para o show sertanejo na arena do parque e esses caras debulhando um Pantera no palco, lotado de gente, o povo embaixo pulando e curtindo. Uma dicotomia rara. Tem a galera do Foge à Regra, que faz um som com uma pegada mais reggae, mas mesclando elementos de outros ritmos, e também está aí na batalha, já gravou música autoral, inclusive. O batera deles, Arthur (Marandola), era antes integrante da Macaxeira Orgânica, banda cover dos Raimundos, cheia de energia. Tinha ali também o Diego, o Pedron e o Fritz. A Outro Lado, que é uma banda formada por professores ou ex-professores da escola de música e estúdio Sonora e com frequência estão tocando em Palotina e cidades da região, formada por Fernando Bonfim, Gustavo Soares, Vini Pelin e Matheus Gentil.
Tinha a Rock Tártaro que era liderada pelo Emanuel e tocaram em vários lugares. Ao que parece, eles passam por uma reformulação e tudo indica que vai vir coisa muito boa pela frente. Não sei se com o mesmo nome, mas tocaram no festival da cerveja aqui de Palotina com o Thiago no vocal, um cara que manda muito bem. E as duas em que participo, a Bluestones e a Big Lips, que já citei acima. Tinha a banda em que o Maykel era o vocal, os caras estavam ativos até pouco tempo atrás, mas não consigo lembrar o nome da banda de jeito nenhum (Kranios?). Faziam um hard rock com uma pegada de outro mundo
RDVO: Cara, eu era fã da After Lightining, hein... pena que acabou.
ED: Sim, mandavam muito bem, o João (Vitor Farias) arregaçava na guitarra.
RDVO: Muito! E o vocal também era ótimo. Acho que você, o Maykel e o Matheus Gentil são os melhores vocalistas na cidade hoje pra alcançar notas altas - ainda não ouvi o Thiago cantando, mas só ouvi falar bem. O Manu também evoluiu demais, nossa! Cantando rasgado!
ED: Bem, obrigado Luh. Vc ainda não viu algum ensaio da Big Lips. Nossa, e pensar que era pra ser provisório esse nome...
RDVO: Ainda não vi... Dou força pro nome ser Big Lips kkkkk o Jairo sempre fala que vai ter que mudar e eu digo que não tem que mudar ahahahhahaha
ED: Pra mim, lembra banda meio escrachada tipo Raimundos ou Velhas Virgens kkkkkkkk
Termino a conversa agradecendo o Du pela disposição em responder minhas perguntas e ele me oferece as fotografias que ele tem em casa. Ou seja, logo teremos conteúdo pra alimentar nossa página de Galeria de Fotos do site!
Se você chegou até aqui na leitura deste post, eu tenho ~algumas várias~ coisas pra te dizer: 1) parabéns pela persistência e 2) assim como eu, você também é curioso pra conhecer as histórias do rock palotinense.
Então a gente combina assim:
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b) compartilhe este post ou marque nos comentários a galera mencionada pelo Du neste post, pra gente conseguir entrar em contato com o máximo de gente envolvida no rock'n'roll palotinense e ir coletando muito mais histórias;
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Té mais, galere! \m/